terça-feira, 22 de maio de 2012

Ponto de Vista


Ponto de vista                                                         
 A chuva cai sem a menor piedade do lado de fora da casa, o som das incontáveis gotas que chegam ao telhado tornam-se um ruido, e logo um estrondo.

A garota fica olhando pela janela, enquanto velozes gotículas correm toda a extensão do vidro à sua frente. Deixa as costas de uma das mãos encostar de leve no vidro, e estremece ao sentir o frio morder-lhe a pele. Os raios cruzam os céus em uma batalha violenta contra a terra, castigando-a de tal modo que por inúmeras vezes a noite chega a confundir-se com o dia. O som de um pequeno rádio de pilhas que se encontra perto do parapeito perde-se em meio aos trovões.
Ela deixa a cabeça pender, encostando a testa na janela, e mais uma vez, seu corpo estremece por causa do frio. Nunca teve medo da chuva, nem de trovões, mas aquela não era uma tempestade qualquer, cada raio parecia cair mais perto, e cada trovão ribombava em seus tímpanos com tanta força que ela já escutava um pequeno zumbido contínuo e ligeiramente irritante.
Mesmo dali, ela podia sentir um cheiro suave de comida vindo da cozinha, seu estômago roncou, mas ela não podia fazer nada, tinha que esperar…não podia tirar os olhos da janela.
A chuva continuava, agora a água corria na rua da frente, descendo como rios. Os carros passavam rapidamente e espirravam um misto de água e lama na janela. Ela levou a mão ao vidro mais uma vez, não queria parar de olhar, ela tinha que ter esperança. O frio começava a incomodá-la, sentia-se uma presa fácil parada ali daquela maneira.
O cheiro de comida foi ficando mais forte, e a sua obstinação mais fraca, ela não queria mais esperar. Começou a sentir-se letárgica, o frio pareceu ir diminuindo aos poucos, e um sono muito reconfortante começou a embalar o seu corpo. Quando estava quase dormindo eles chegaram.
Era uma família completa, um casal com um filho, que devia ser um pouco mais novo que ela. Eles não a viram rapidamente como ela esperava, mas sentaram-se à mesa que ela estivera observando dali, do lado de fora. Viu quando eles fizeram uma oração, agradecendo pela comida, ou podia ser um simples delírio causado pelo frio. Tentou mais uma vez limpar o vidro que estava ligeiramente baço por causa da lama, e foi quando os três olharam para ela.
Por um momento, que pareceu uma eternidade os olhares dos quatro se cruzaram, os seus imploravam por piedade, o dos três pediam desculpas.Não, na verdade só os do casal pediam desculpas os olhos do garoto mostravam dúvida, ele não compreendia o que aquela garota mal vestida estava fazendo ali, do lado de fora da sua casa, completamente encharcada e tremendo de frio. Seus olhos iam dos da garota para os dos pais, mas eles estavam calados.
Ele levantou-se correndo com seu prato feito nas mãos, o pai gritou alguma coisa sobre ser inútil, e a mãe abaixou a cabeça.
A garota já não conseguia pensar, pra onde ele tinha ido? Ele estava demorando…deve ter ido comer no quarto, pra não ter que ficar me olhando…
A porta da frente da casa abriu e o garoto veio sozinho, segurava um guarda-chuva colorido e cheio de bonecos entre o pescoço e o ombro, o seu prato de comida e um cobertor com os mesmos bonecos do guarda-chuva.
- Toma, é pra você. – disse numa vozinha fraca, que mal se fez ouvir entre os trovões.


 E pela primeira vez naquele dia, a garota sentiu algum tipo de calor em seu corpo, o calor das lágrimas que se misturavam à água da chuva, mas que foram o suficiente para deixá-la sorrir.

3 comentários:

  1. Muito legal Primo!! Ta de parabéns!! By Luiz Otavio!

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  2. Guigo, ja viu os seriados Supernatural, The Big Bang Theory? São otimo seriados, fica a dica!

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